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Odulio Botelho de Medeiros |
A multiplicidade
de Walter Canuto
Na juventude Walter Canuto fazia versos por simples prazer, sequer guardando-os como ele próprio afirmou, em entrevista prestada ao Jornal Metropolitano
Odúlio Botelho de Medeiros*
Advogado (“Folha
da Cidade” – 24/6/2022)
-
Relembramos, com saudade, a nossa convivência com o múltiplo Walter Canuto, que
se encantou alguns anos após o lançamento do seu livro “Ao Entardecer”,
inegável fonte vivificante de poesia. Canuto era o artesão do soneto. O mestre
de obras da poesia. Para homenageá-lo, post mortem, republico o prefácio que
tive a felicidade de lavrar para o seu festejado livro.
Prefiro
falar primeiro, nestas linhas prefaciais, sobre o cidadão Walter Canuto de
Souza, antes mesmo de examinar a sua poética. O autor de Ao Entardecer provém
das famílias Canuto e Souza, das bandas de Mossoró.
Os Canuto
sempre foram bons de bola, de farra e de gogó. Tanto que quase todos os irmãos
de Walter jogaram futebol nos campos de Mossoró ou mesmo de Natal, sendo que os
seus irmãos José e Hemetério foram campeões pelo América Futebol Clube do ano
de 1930 e integraram a famosa Seleção do RN, conhecida como Fantasmas do
Nordeste.
De sua
vez, o seu sobrinho Juarez foi craque, também, do América na década de 50. Ao
bem-dizer tenho a impressão de que tanto a velha quanto a nova geração dos
Canuto pendem para as cores rubras do vice-campeão brasileiro da série C, deste
ano de 2005.
Além
disso, eles são músicos, cantores, ritmistas a começar pelo velho Miguel
Canuto, genitor do prefaciado, com atuação em bandas e charangas de Mossoró,
inclusive nos blocos de carnaval. Chegando a Natal a família foi morar no sítio
que ficava na esquina das ruas Olinto Meira e Alexandrino de Alencar,
justamente em frente ao sítio do Senhor Ismael Pereira, tendo por caseiro o seu
irmão Juvenal, o famoso “Dr. Choque”, figura folclórica muito conhecida e
estimada pelos natalenses.
Aí foi que
o jovem poeta conheceu de perto a boêmia da terra, pois o velho Miguel
conseguia reunir, aos domingos, o melhor da pândega da cidade, como Mário
(violonista-irmão de Walter) e por intermédio deste aproximaram-se os Botelho,
tradicional família de boêmios e músicos, com destaque especial para Israel
(pai de Mabel – mulher de Walter) que era compositor, pesquisador de modinhas e
grande violonista; João Botelho, pai de Abelardo, que na época tornara-se um
dos melhores violonistas do Brasil; Sebastião Barros, o Cachimbinho que se
iniciava no clarinete, para depois, ao lado de Severino Araújo, Abel Ferreira e
Luiz Americano formarem o quarteto de ouro dos clarinetistas deste País, sendo
Cachimbinho o destaque como compositor de grandes choros que hoje estão
definitivamente incorporados à música popular. Nesses encontros com a
participação, também, dos cantores Chico e Cleto Botelho, as duas famílias se
uniram em torno da música, do teatro e da poesia, sendo que Walter desde jovem
tinha o hábito de cantar e de ser poeta. Essa união rendeu outros frutos:
Walter Canuto de Souza casou com Mabel Botelho. Pense!
Lá pelos
idos de 1939, a referida rapaziada cantava em coral as músicas nacionalmente
divulgadas por famosos conjuntos musicais, entre eles: Anjos do Inferno, Quatro
Azas e um Coringa, Bando da Lua, Demônios da Garoa e outros tantos. Estavam tão
afiados que o grupo resolveu criar o seu próprio conjunto o que ocorreu em
1940, com o nome de Vocalistas Potiguares, por sugestão do poeta Walter. O
grupo que de início era composto por vinte pessoas, personalizou-se com nove
componentes, entre músicos e cantores, tomando forma definitiva com os seguintes
membros: Walter Canuto, voz solo; Roldão Botelho, violão e voz; José Alves e
Enock Figueiredo, percussão; Luiz Alves, pandeiro; Josué Fernandes Primo surdo.
Em fase posterior, Sebastião Botelho substituiu o violonista José Alves. O
escritor Manoel Procópio Júnior, que fez editar um livro de grande valor
histórico sobre os conjuntos vocais deste Estado, descreve com riqueza de
detalhes a atuação dos Vocalistas Potiguares que em nada ficou a dever aos
grandes conjuntos musicais do Brasil.
Na
juventude, Walter Canuto fazia versos por simples prazer, sequer guardando-os
como ele próprio afirmou em entrevista prestada ao Jornal Metropolitano –
Suplemento Cultura & Etc... – De 26 de agosto deste ano, editado por
Justiniano Neto, sendo que, por diletantismo, retinha os versos na memória e os
recitava em algumas oportunidades, de conformidade com o astral momentâneo. A
vocação pela poesia chegou muito cedo, desde a época das tertúlias do Alecrim,
tempo em que conviveu com grandes poetas de Natal, entre outros, Olavo
Medeiros, Macrino, Abelardo Botelho, fazendo questão de enaltecer os
ensinamentos da professora Josefa Botelho (hoje nome de escola da rede
municipal de ensino e de rua em Natal) que naquela quadra incentivava os seus
alunos pelo gosto à leitura, inclusive da poesia. Mas, afirma o prefaciado que
foi mesmo a partir de 1970 que tomou gosto para fazer e liberar versos. O livro
que agora apresenta ao público leitor do Estado do Rio Grande do Norte é
composto por mais de cem trabalhos poéticos, da melhor qualidade, que está
dividido em sonetos, poemas, glosas, sextilhas e trovas. Diz que não fez
incluir no livro trabalhos de prosa, para não misturar as coisas, no que fez
muito bem.
Curiosa é
a metodologia aplicada por Walter para fazer versos. Tem característica própria.
Nas madrugadas, ao chegar a inspiração, o poeta passa a mentalizar e moldar os
versos. Após esse exercício intelectual dorme, e, ao despertar, passa para o
papel o poema preconcebido, que fica completo pronto e acabado, exatamente como
foi idealizado anteriormente.
No livro
de Walter, que foi editado pela Fundação José Augusto - FJA, o soneto está em
alta, pois o autor é cultor emblemático desse gênero de poesia. Certa vez o
poeta Nei Leandro de Castro segredou-me que gostava muito de ler sonetos.
No meu
pensar, a produção poética do autor é muito boa. Motivada. Criativa. Culta.
Além disso, é harmônica e romântica. Ao ser lida faz-se logo entendida. Gosto
muito dos sonetos produzidos por Walter, mesmo reconhecendo (como ele mesmo
reconhece) que é dificílimo lidar com esse ramo poético. Que maravilha!
Além de
tudo isso, tenho a dizer que o autor de Ao Entardecer é um autodidata que
convive com os livros carinhosamente. Quase me esqueço de dizer que Walter
Canuto sempre trabalhou em prol da família, que ninguém é de ferro.
Não se
poderá afirmar que o inspirado Walter Canuto está publicando tardiamente o seu
livro, uma vez que os passos do homem são dirigidos pelo Senhor, como, pois,
poderá o homem entender o seu caminho? – Provérbios 20: 2, ou mesmo que; há
tempo para tudo – Eclesiastes 3;8.
Leiam com
os olhos bem abertos o poema Crepúsculo, um dos favoritos do autor. A poesia
faz a vida mais feliz e Walter Canuto fez da vida uma fonte de inspiração.
*Odúlio
Botelho de Medeiros (Natal, 20//10/1939 – 4/8/2025). Foi presidente da Ordem
dos Advogados do Brasil/RN (1991/93). Foi do Instituto Histórico e Geográfico/RN.
E da Academia de Letras Jurídicas.
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