Coluna: "Primeira Fila" – O Globo (15/8/1942)
38º aniversário do
Botafogo Football Club
1. Raul Maranhão
ficou parado, no meio do largo, com os braços caídos. Depois ele foi a passo
mole, apanhar as botinas. Enfiou um pé. Enfiou o outro. Devagar. Como se
esperasse alguma coisa. A janela da casa dos Figueiredo batera com força. E
tudo mergulhara em silêncio. Raul Maranhão foi andando. Alcançou-se a calçada. E,
de repente, voltou-se. “Que diabo! Não morreu ninguém!” Flávio Ramos fez um
gesto vago. Chegou a abrir a boca. O som ficou lá dentro. Raul Maranhão sacudiu
os braços. Gritou: “Digam alguma coisa!” E nada, E nada. Então, Raul Maranhão
deu as costas. Atravessou a rua. Encaminhando-se para o poste da rua Conde de
Irajá. O bonde demorava. “É sempre assim – pensou Raul Maranhão – não há jeito
de o bonde chegar à hora certa”. Ingratos. Sim. Ingratos. “Também nunca mais eu
virei cá. Para quê? Não se pode dar um shoot mais forte”. E quase Raul Maranhão
sorriu. A bola subira, passara por cima das palmeiras, ficara um ponto negro no
ar. “O mais belo pontapé da minha vida. Eu devia sentir-me orgulhoso. Maldita
clarabóia!”. Ninguém, ninguém tinha falado em clarabóia. Pelo contrário. Raul
Maranhão volta-se. Pronto a abrir os braços. A desculpar todo mundo. Não era
com ele. Era com o “Bororó”. “Alberto, mamãe está chamando” O bonde despontava
lá em Humaitá.
2. Mandou-se chamar
Alfredo Chaves. E Alfredo Chaves subiu as escadas do “puxado” da casa do
conselheiro Gonzaga. Flávio Ramos recebeu-o com um: “Ainda bem que veio você
veio!” “Quê houve?” – perguntou Alfredo Chaves. Octávio Werneck explicou. “E
quanto custa a clarabóia?” “Sei lá!” A voz de Flávio Ramos era de desalento. E
Alfredo Chaves olhou para ele, espantado: “parece que você passou a noite em
claro!” “Você fala assim porque não viu nada. “ Octávio Werneck começou a andar
de um lado para o outro. Com as mãos cruzadas atrás. Um pouco curvado. E quando
parou foi para encarar Alfredo Chaves: “Você sabe que a gente jogava no campo
das palmeiras porque tinha crédito”. Alfredo Chaves sabia. A indenização das
vidraças partidas era uma espécie de aluguel. “E não saía barato – acrescentou
Flávio Ramos – Uma vidraça, porém, é uma vidraça. E uma clarabóia…” Alfredo
Chaves arrastou uma cadeira de palhinha. Começou a fazer contas com os dedos.
“O único jeito que há é pagar a clarabóia”. Flávio Ramos e Octávio Werneck
deram um salto. Pagar a clarabóia? Como? “Raspa-se a caixa do clube. Faz-se uma
subscrição. Qualquer coisa. O Botafogo precisa sair do largo de cabeça
erguida”. Flávio Ramos criou alma nova. A clarabóia ia ser paga, não ia? Então
se podia continuar no campo das palmeiras. “Para quebrar outra clarabóia? –
falou a voz do bom senso de Alfredo Chaves.
FONTES
Arquiba Botafogo (Paulo Marcelo Sampaio)
Mundo Botafogo (Ruy Moura)
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