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quinta-feira, 6 de novembro de 2025

João Machado, "Rolinha" e o tribunal esportivo

O ex-jogador e antigo árbitro cearense Raimundo da Cunha Rolla, o "Rolinha", entrega Prêmio Belfort Duarte ao jogador Kitt, do Tricolor/Almanaque do Ferroviário


Janela Indiscreta*

DERIVATIVO

Um papo com João Machado, com ou sem cenário de cerveja, é um derivativo, como ele próprio diria. Um derivativo da melhor qualidade, inclusive porque, com João Machado, sempre se aprende alguma coisa, além de futebol e direito esportivo.

"O que é bom em futebol é o antes e o depois". A frase (cuidado com as interpretações...) não se constitui uma denúncia da péssima qualidade do futebol jogado normalmente em Natal. Para que perder tempo denunciando fatos notórios? Mas o que João Machado quer dizer é isso mesmo: o "antes" e o "depois" compensam largamente os sacrifícios (até mesmo os financeiros) que o esporte impõe aos seus apaixonados. Ainda que o sacrifício seja esse de ver futebol ruim quase todos os domingos.

"A cachorrada é o melhor de tudo". É outra frase. Meio confusa, sobretudo pelas deficiências extrínsecas e intrínsecas de identificação. Mas não duvidamos: a cachorrada deve ser o melhor de tudo...

E na cachorrada deve embarcar quanto há de mais sério no esporte: desde a burocracia complexa imposta por uma lei que vigora realmente, até aos tribunais funcionando dentro da mais pura ortodoxia jurídica.

E dentro dos tribunais se desenrolam as melhores histórias que João Machado conta. Porque é ali que a seriedade atinge os píncaros.

"A seriedade é uma delícia", explica. "Já pensou, eu tratando o Antônio Soares, companheiro fiel de Grande Ponto, por vossa excelência? Pedir licença para levantar ou concedendo essa licença, quando ele aparece como advogado nos tribunais a que eu presido? E tem uma coisa: a seriedade nos nossos tribunais esportivos não fica nada a dever aos tribunais de Justiça. Ao contrário: ali a coisa funciona com todos os RR e PP."

Há as histórias que João Machado conta e que mereciam ser condensadas em livro. Aquela do juiz cearense que se refugiou no Rio Grande do Norte com vergonha da alcunha pela qual era conhecido nas terras de Iracema, só tem o defeito da alcunha, que a torna impublicável. Esse juiz levou ao tribunal um atleta que, em pleno campo, chamou o juiz pela alcunha. João Machado defendeu e conseguiu a absolvição do jogador com o fortíssimo argumento, provado em plena sessão, de que até os membros do tribunal só conheciam o juiz pela alcunha. Foi uma absolvição conseguida na base da pornografia. Mas dentro da mais severa seriedade.

Em Natal João Machado é quase sinônimo de esporte. Está em todas. As coisas passam de mão em mão e acabam sempre na mão de João Machado. Aliás, as mãos não são muitas, porque poucos são os apaixonados pelo esporte. Sobretudo, os apaixonados pelos "antes" e o "depois". Poucos, mas bons, diga-se.

Nenhum deles, porém, nos parece que se tenha aperfeiçoado como João Machado, na ciência de fazer da seriedade e do sentido de responsabilidade o melhor derivativo da sua vida.

O que não invalida a justiça de o considerarmos o servidor número um do esporte natalense.

A crônica de hoje, caros leitores, também é um derivativo. Em homenagem a João Machado.

 

*NOTA DA REDAÇÃO: o artigo foi extraído do semanário católico A Ordem (sábado, 2 de maio de 1964), coincidentemente ou propositalmente escrita pouco mais de um mês e 15 dias após a estreia da coluna Tribuna de João Machado no diário matutino Tribuna do Norte.

A coluna Janela Indiscreta, cujo responsável não é identificado, certamente tem o título derivado do filme homônimo lançado em 1954, dirigido pelo diretor de cinema inglês Alfred Hitchcock, tão em voga na época.

Quanto ao árbitro de futebol da crônica o editor do blog acredita que se refere ao ex-jogador e juiz cearense Raimundo da Cunha Rolla, mais conhecido, popularmente, como Rolinha.

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